Recursos de IA como visão computacional, linguagem natural e leitura de dados heterogêneos abrem possibilidades tão amplas de automação, que impõem o desafio de identificar de forma assertiva as inovações com maior relevância e efetividade para funcionários, clientes e para o próprio desempenho do negócio. “O processo que antecede a adoção é mais importante do que as tecnologias em si. Hoje, preferimos nem começar projetos sem um assessment adequado”, afirma Caio Lima, diretor de desenvolvimento de negócios e CX da Embratel. “Não basta convencer o CEO a aprovar e o CFO a liberar os recursos. A forma de contar a história ao time de operações é essencial. Se a inovação não facilitar a vida do pessoal de operações, não se tem resultado”, nota Alex Pinto, diretor de marketing do Grupo IMC (detentor de oito marcas de franquias de alimentação, como Pizza Hut, KFC e Frango Assado).
Os especialistas em Experiência do Cliente (CX) participaram do painel Hiperautomação e Inteligência Artificial: o futuro da transformação digital nos negócios, no Conarec 2024, que ocorreu nesta semana em São Paulo. Com um tom muito pragmático, nessa sessão João Torniero, diretor comercial da CSU Digital (processadora de cartões), e Anderson Vera, diretor de tecnologia da Midway (o braço financeiro do Grupo Riachuelo), também compartilharam suas estratégias e aprendizados, com descrição de alguns cases já implementados e em produção.
Automação fim a fim e instrumentalização dos agentes
Da perspectiva de Torniero, da CSU, o maior benefício da IA foi disponibilizar ao atendimento bases de informação cada vez mais ricas. “Com IA se libera uma base de dados muito mais ampla. A falta de padronização dos dados torna a qualidade dos cadastros um problema recorrente. Se não houvesse uma camada capaz de entender os dados, não se teria como trabalhar com data lakes gigantes”, explica.
O diretor da CSU diz ainda que para atender às prioridades mais críticas, de prevenção a fraudes e charge back, é preciso direcionar informação, a partir de diversos tipos de dados, a vários processos e agentes. “A IA nos permitiu criar modelos mais eficientes e rentáveis”, diz.
Alex Pinto conta que a empresa investiu para tirar o atendimento do caixa convencional e aloca as pessoas exclusivamente para a atividade-fim. Ele informa que mais de 40% das vendas são no autoatendimento e que os canais digitais cresceram 50% em 2024.
Entre os resultados, se constatou que diante da máquina há uma aceitação 10% superior às sugestões (acréscimos de itens ou combos) feitas pelos atendentes. “A cereja do bolo é o dado. Por isso investimos em canais próprios”, destaca.
“Percebemos que o ganho com IA não está na tecnologia, mas na mudança de mind set”, diz Anderson Vera, da Midway. No painel, ele descreveu um piloto com empresa de cobrança Monest, em que se aplicou IA nos processos convencionais de cobrança. Entre os resultados foram 30% de aumento na recuperação, 50% de redução de custo e 90% dos acordos fechados em até 3 minutos.
“O pulo do gato é que o processo roda à velocidade do cliente. Nós ligamos na hora que é melhor para ele”, resume.
Vera adianta que podem ser desenvolvidas outras inciativas, envolvendo IA, sempre a partir de uma definição assertiva do escopo. “Podemos descobrir muitas coisas. Por exemplo, a fraude sempre existe, mas com monitoramento social vemos que modelos podem evoluir para perceber os riscos antes das tentativas”, exemplifica.
Além da área financeira, o diretor da Midway vê potencial em setores como varejo (físico e virtual) e cadeias de suprimentos.
“Faz muito sentido o uso de IA para empoderamento do agente. Hoje falamos em humanizar as máquinas, enquanto os modelos de atendimento ainda robotizam os humanos”, adverte Caio Lima.
Hype x oportunidades práticas
Os executivos da CSU e do Grupo IMC vislumbram uma série de aplicações que podem ser os próximos passos do uso de IA. “Podemos ter saltos de produtividade com a hiperpersonalização das jornadas dos funcionários, que passarão a dispor de assistentes pessoais”, menciona João Torniero. Alex Pinto observa que a integração de IA e IoT abre mais possibilidades. “Já existe tecnologia para padronizar a troca de óleo (com fritadeiras conectadas e envio de instruções a pessoas ou dispositivos automatizados)”, exemplifica.
O diretor da Embratel pondera que o pragmatismo e a maturidade dos participantes do painel ainda estão longe de ser o senso comum. “Em muitos casos, temos que equilibrar o ímpeto de alguns clientes, porque o hype torna as abordagens perigosas. O primeiro ponto da jornada é uma consultoria cuidadosa”, insiste.
Caio Lima aponta que um dos equívocos mais comuns é dispersar as iniciativas em várias áreas, sem cuidados de uma consultoria estratégica. “Quem não tem expertise e uma estratégia clara de atendimento vai atrás do discurso de marketing das fábricas de software ou dos gurus, e compra promessas que só se cumprem no Power Point””, resume.
“Implantação da tecnologia não é projeto de três meses; é uma jornada de três anos”, define Lima. Ele argumenta que o papel dos provedores e parceiros é ajudar o cliente a ter uma visão estratégica, mesmo que isso frequentemente reduza as vendas de curto prazo. “Não somos fornecedores; somos consultores. Tenho que correr o risco de vender menos, conforme o que faz mais sentido para o cliente”, reconhece.