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Brasil tem ambiente propício para o desenvolvimento de fintechs

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Na visão de Bruno Diniz, especialista em inovação no mercado financeiro, a introdução do PIX, o sandbox regulatório e o open banking criam um ambiente fértil para as fintechs



Por Redação em 21/03/2022

O Brasil já tem mais de mil fintechs e está entre o top 5 dos países que mais atraem investimentos para esse setor. Além disso, a cidade de São Paulo (SP) está em quarto lugar entre as que oferecem melhores condições para esse mercado em todo o mundo, atrás apenas de São Francisco, Londres e Nova York. 

Na visão de Bruno Diniz, especialista em inovação no mercado financeiro e autor dos livros O Fenômeno Fintech (2020) e A nova lógica financeira (lançado em novembro de 2021), a razão disso é o que país conseguiu criar um ambiente propício ao desenvolvimento deste tipo de negócio. “Além da própria demanda da população, outras coisas favorecem o surgimento de fintechs. Somos um dos únicos países do mundo a ter um sistema de transferências bancárias 24 horas sem taxa, como o PIX, que contou com uma incrível adesão. Outros fatores que contribuíram para isso foram a instituição do open banking e o sandbox regulatório, que possibilita que várias tecnologias inovadoras sejam testadas e reguladas rapidamente”, explicou. 

Diniz tem um extenso currículo na área. Além de autor dos dois livros citados, ele é sócio de uma consultoria em inovação focada no mercado financeiro, professor de MBA da Universidade de São Paulo (USP), em um curso voltado à inovação do mercado financeiro, e diretor da Financial Data & Technology Association (FData), associação britânica focada no mercado financeiro, que nasceu com a premissa de ajudar o desenvolvimento do open banking na Inglaterra, mas que em 2020 expandiu sua atuação para a América Latina.

Confira os principais trechos da entrevista exclusiva de Bruno Diniz ao Próximo Nível.

Por que as fintechs são um fenômeno no Brasil, em sua visão?

Bruno Diniz – O setor bancário era muito desenvolvido no Brasil, já há alguns anos, mas havia muito pouca competição. As mudanças no setor financeiro, com o open banking, trouxeram a possibilidade de modificar esse cenário. 

Porém, as novas empresas a disputarem um lugar no mercado precisaram investir em inovação para conseguirem disputar com os grandes players da área. E foi com base nisso que as fintechs se destacaram, proporcionando novas experiências aos usuários, simplificando o acesso a serviços e até facilitando a inclusão. 

Além disso, aqui no Brasil houve uma conjunção de fatores que facilitou o desenvolvimento das fintechs: a criação (e adoção maciça) do PIX, que modificou toda a infraestrutura de pagamentos; a evolução da regulamentação e a chegada do open banking.

Apesar de todas as dificuldades, o Brasil pode ser reconhecido como um país inovador nessa área?

Bruno Diniz – Sem dúvida! No mundo, poucos países têm um sistema de pagamentos como o PIX. Isso simplificou várias transações financeiras e facilitou as transações. Sem taxas para pessoas físicas, com transferências em tempo real, o sistema trouxe uma nova experiência para os meios de pagamento.

Além disso, no Brasil tivemos o sandbox regulatório, que basicamente é um modelo britânico, no qual os reguladores fazem um ambiente de testes para inovações. Isso é muito importante, porque as empresas não precisam aguardar a regulamentação para trazer os seus serviços ou produtos. Ao participarem do sandbox, suas soluções são analisadas e testadas pelos reguladores, sem perderem o timing da inovação.

No Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o Banco Central (BCB) e a Superintendência de Seguros Privados (Susep) possuem sandboxes, permitindo que as startups façam o caminho inverso do tradicional, ou seja, que testem sua solução, que poderá ser regulada depois. 

Outro destaque do Brasil foi o Open Banking, ou Open Finance, que trouxe a possibilidade de os usuários compartilharem seus dados entre instituições bancárias. Isso faz muita diferença para que os novos players possam oferecer serviços personalizados. Isso permite novas experiências financeiras e viabiliza novas taxas, mais acessíveis aos clientes, o que contribui para que mais pessoas possam utilizar os serviços.

O ambiente é favorável, pois existem várias oportunidades e ainda há muito a ser feito no setor. De olho nisso, muitos fundos internacionais resolveram mirar no Brasil, o que trouxe recursos para startups crescerem. Apesar de o Brasil ser um país complexo, estes outros aspectos balanceiam a forma geral de se fazer negócios aqui. O Brasil não é só uma referência em toda a América Latina, mas sim no mundo todo.

Em sua visão, as fintechs utilizam o mesmo nível de tecnologia que outros fornecedores de serviços bancários?

Bruno Diniz – Não, porque é justamente nesse aspecto tecnológico que tais empresas se diferenciam. Dentre diferentes tecnologias elas usam soluções em nuvem, por exemplo, que garantem maior escalabilidade, têm estrutura mais moderna e mais leve. 

Algumas instituições tradicionais se saem melhor na área de segurança da informação, mas os bancos têm um grande problema, que é lidar com os sistemas legados, com tecnologias já antigas. 

As fintechs, ao contrário, nasceram em um novo contexto, usam estruturas mais leves, aliadas à inteligência artificial e capacidade de analisar dados de forma diferente de instituições financeiras. 

Hoje, um ambiente com mais competição faz com que bancos fujam, cada vez mais, de serviços financeiros comoditizados. Por exemplo, atualmente, fica difícil uma instituição cobrar tarifa de conta, por exemplo, sendo que não entregam nada a mais do que as fintechs para a mesma solução. Sendo assim, as instituições precisam criar novas formas de validar algumas cobranças, sobretudo agregando valor, e quem se beneficia é o cliente. 

Então, as fintechs viabilizam o acesso de mais pessoas aos sistemas financeiros?

Bruno Diniz – Sim, não faz mais sentido para ninguém arcar com tarifas para serviços se existem outras alternativas tão eficientes quanto, senão mais. Um exemplo disso foi o PIX, criado em 2020. Até então, as pessoas precisavam aguardar os horários do expediente bancário e pagar taxas para DOC ou TED. Trata-se de uma infraestrutura de pagamentos interoperável que é utilizada por vários agentes do sistema financeiro (desde bancos até fintechs). A solução de transferências entre pessoas é gratuita, mas o recebimento via Pix pelas empresas é passível de cobrança (caso a instituição queira).

Hoje, o PIX mostrou que essa cobrança de tarifas não faz mais sentido, sendo que algumas fintechs estão preferindo zerá-la para empresas, no sentido de ganhar mais terreno . Isso traz a mudança de matriz de custos para o consumidor, além de simplificar significativamente o sistema de meios de pagamento e promover maior concorrência. 

Em sua visão, quais são as tendências para o setor financeiro no Brasil?

setor financeiro

Bruno Diniz – Vejo três principais tendências. Uma delas é o chamado “banking as a service”, ou seja, soluções que permitem que empresas de outros segmentos passem a ofertar também serviços financeiros. No Brasil, já temos visto isso com grandes varejistas, como a Via, que oferecem serviços de crédito, pagamentos de contas, cartões, entre outros. É a chamada “fintechização“. 

Para o cliente, isso traz vantagens no atendimento, visto que há a fusão do online com o offline, fazendo com que empresas que já têm uma base grande de clientes possam oferecer também serviços financeiros personalizados. 

Outra tendência é o Beyond Banking, que é o caminho inverso, no qual bancos, fintechs e demais instituições financeiras passam a oferecer soluções que vão além dos produtos bancários. Assim, vemos a criação de marketplaces, soluções de telefonia móvel, dentre outras, onde esses players passam a se apresentar como uma plataforma capaz de resolver diferentes problemas presentes no dia a dia dos seus consumidores.

Por fim, outra tendência muito forte é o crescimento do mercado cripto. Muitas fintechs estão empenhadas em aproximar o mercado financeiro tradicional da criptoeconomia, oferecendo soluções dentro de uma nova realidade que passa a ganhar cada vez mais visibilidade nos tempos atuais. Esse é um caminho sem volta, os próprios bancos centrais estudam a criação de CBDCs (moedas digitais emitidas por bancos centrais), a exemplo do Real Digital. Esse é o primeiro passo para que mais pessoas se familiarizem e passem a utilizar criptoativos.

Quais mudanças esse cenário todo traz ao consumidor de serviços financeiros?

Bruno Diniz –  O consumidor brasileiro é bem receptivo à tecnologia, e vejo que isso vem progredindo. Boa parte da população tem smartphone e cada vez mais pessoas o utilizam para transações e pagamentos, por meio de aplicativos de bancos. As pessoas estão mais confiantes com o conceito de dinheiro digital e transações online, o que abre grandes perspectivas para a disseminação da tecnologia.

Acredito que veremos, em 2022, um ano de crescimento intenso e de acelerada evolução do mercado financeiro brasileiro, com surpresas tão boas quanto as que tivemos no balanço de 2020 para 2021.



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