Vilson Cobello Junior, diretor de TI do Hospital das Clínicas da USP, não chegou a comparar o custo (nem viabilidade) de manter um especialista nas 27 unidades de saúde, em todo o país, com o de médicos atendidos pelo TeleUTI. O principal resultado que ele cita é a redução de 80% em óbitos em UTI, pela colaboração dos médicos muito especializados e experientes do HC. Além da interação com os profissionais locais, o especialista pode “se aproximar” dos pacientes, com o monitoramento em tempo real. “Quando o médico vê os dados dos equipamentos de forma integrada, já tem a informação para saber como orientar”, explica.
A combinação de IoT e conectividade avançada no setor de Saúde foi eixo de um dos painéis do evento IoT e redes privativas, da Tele.Síntese, em que outros temas de sustentabilidade e relevância social permearam as demais sessões.
O diretor de TI do HC contou que a instituição está desenvolvendo uma rede 5G privativa, no Quarteirão da Saúde (um complexo de hospitais de referência), para garantir uma conectividade mais segura e eficiente para os equipamentos de monitoramento e diagnóstico. “Os dispositivos de IoT têm que estar em redes segregadas. Não se pode interconectar com tudo. Nos projetos com 5G também é mais fácil a adoção de novas tecnologias”, explica.
Transição energética, agricultura de precisão e gestão ambiental
De acordo com o BNDES, o uso de soluções sustentáveis e IoT pode gerar economias de até US$ 5 bilhões por ano em recursos no Brasil, até 2027.
Além dos eixos tradicionais de IoT, como cidades inteligentes e automação industrial, um dos setores em que a tecnologia faz convergir economia e sustentabilidade é no agronegócio. Neste momento, três vertentes de inovação convergem para transformar as fazendas: os sensores, drones e outros dispositivos que coletam dados de forma constante e granular; as aplicações de dados, que dão visibilidade de cada detalhe da operação e direcionam a otimização de tudo; e o maquinário automatizado ou autônomo, que executa com precisão as práticas mais racionais em cada pedaço do chão.
Na prática, à medida que uma câmera é capaz de identificar um organismo ofensor e a aplicação do defensivo é feita só naquele ponto, em vez de pulverizar toda a lavoura, são economizados milhões de reais por ano em químicos, com um impacto muito menor ao solo e aos próprios alimentos.
“Agricultura de precisão gera sustentabilidade em larga escala”, define Marcos Ferraz, presidente da AsBraAP (Associação Brasileira de Agricultura de Precisão e Digital). “O agronegócio não tem tanto dinheiro quanto se imagina. O setor é rico porque é grande. Para dar resultado, a solução tem que ter escala”, enfatiza.
Embora as corporações do agronegócio tenham áreas de TI estruturadas, entre os médios e pequenos produtores, segundo Ferraz, as decisões tecnológicas têm um ciclo diferente de outras indústrias. Ele explica que é um setor fortemente movido por relacionamentos. “Meu pós-venda é medir os resultados para mostrar para os vizinhos”, conta. “Nas porteiras já há um aviso: ‘não recebemos vendedores’. O médio ou pequeno produtor compra por meio da cooperativa. Sem comissionar um canal local, nem se abrem as portas”, revela.
Outra característica é que o dimensionamento dos ganhos tem que ser objetivo e relevante. “Os produtores estão acostumados com variações muito amplas de rentabilidade. Ganhos incrementais fazem pouca diferença”, informa.
Na área de logística, junto às aplicações mais conhecidas de rastreamento e telemetria, a combinação de IoT, IA e conectividade abre também espaço para casos de uso relacionados a saúde e segurança. “Há muitas coisas a se explorar. O monitoramento de temperatura e umidade de cargas sensíveis evita perdas ou riscos; a manutenção preditiva dá estabilidade; e o acompanhamento do motorista permite medidas imediatas, como alertas ou treinamentos personalizados”, enumera Carlos Mira, CEO e curador técnico do Frotas Conectadas.
Outra startup que combina IoT e conectividade com direcionamento a ESG é a Minha Coleta. “A coleta de resíduos ainda é o primo pobre do mercado de IoT. Tentamos mudar esse ecossistema com mais tecnologias e soluções”, define Eduardo Nascimento, fundador da iniciativa. A empresa tem parcerias com desenvolvedores de IoT, e, conforme o contrato, consolida os dados capturados por esses dispositivos, assim como outros registros e funcionalidades relacionadas aos processos de descarte ou reúso, em sua plataforma em SaaS. “Um parceiro desenvolveu recuperação de água e há sensores de IoT que medem a pureza e levam essa informação à plataforma”, exemplifica.
Nascimento explica que a empresa atende indústrias com obrigações de compliance e estratégias mais fortes de ESG. A plataforma consolida os contratos com os “fornecedores reversos”, a parte transacional e todo o ciclo de gestão de resíduos. Ele informa ainda que há projetos-piloto em dois municípios para testes de caçambas inteligentes.
Para Anderson Medeiros, CEO da Tradenergy, as pendências regulatórias pesam mais que a capacidade de investimento e a tecnologia entre os desafios para inovação relacionada à transição energética. A empresa desenvolve soluções para conectar consumidores a produtores de energia limpa. Ele argumenta que uma das soluções para responder ao aumento de demanda, de forma sustentável, são pequenas concentrações de unidades produtivas, que compensem a demanda de geradores centralizados. “O grande desafio não é investimento nem tecnologia. É regulatório. O setor ainda é resistente com sanbox e compartilhamento de dados”, constata.
“As startups precisam da aliança com grandes empresas, para explorar as inovações em infraestruturas de alta performance e segurança”, afirma Ricardo Salazar, gerente-geral da Whywaste. “Principalmente em setores gigantescos, em que não se consegue fazer uma PoC em um cenário reduzido, os projetos têm que ser amplos. A parceria com corporações permite as inovações, sustentadas em redes privativas com grande controle de dados”, acrescenta.