A relação entre o bem-estar das pessoas e os resultados de uma organização é algo que está cada vez mais no radar de empresas, sobretudo nas mais atentas a tendências. Nestes empregadores, existe a percepção de que o recurso corporativo mais importante é o humano, e há a necessidade de investir em ferramentas e condições para que colaboradores preservem sua saúde física e mental para fazerem melhores entregas.
Este foi o tema de uma das discussões no palco principal da primeira edição do Web Summit Rio, que aconteceu na semana passada. Durante o painel “Work-life balance: Health is wealth”, Victoria Repa, CEO da startup ucraniana Betterme e João Barbosa, um dos co-fundadores do unicórnio brasileiro Gympass, ofereceram perspectivas complementares sobre o avanço de estratégias de bem-estar, e o papel da tecnologia nessas estratégias.
Ferramentas digitais para o bem-estar
Do ponto de vista do consumidor final, uma das tendências mais relevantes sobre como as pessoas têm usado ferramentas digitais para o bem-estar nos últimos anos está relacionada à prevenção, disse Repa, da Betterme. “A maioria das mortes atualmente é por doenças crônicas e a medicina tradicional não é suficiente para resolver estes problemas”, apontou a fundadora, citando dados da Organização Mundial da Saúde, que calcula que 74% dos óbitos globais estão ligados a doenças como câncer, problemas cardíacos e neurodegenerativos. A maioria destas mortes (86%) ocorre em países de baixa e média renda, como o Brasil.
“A medicina de estilo de vida enquanto melhor cura para estes problemas é um tema que será muito falado. A discussão sobre estilo de vida é sobre prevenção e é também sobre tecnologia,”, disse Repa, cuja empresa desenvolve um aplicativo que ajuda usuários a promoverem mudanças na saúde física e mental.
Como o conhecimento das pessoas sobre a necessidade de se cuidar aumentou significativamente – e especialmente após a pandemia – organizações se veem instadas a responder a essas novas demandas, disse Barbosa, da Gympass. A empresa gerencia um ecossistema que permite o acesso a aplicativos com foco em áreas desde meditação até gestão do sono, além de prover acesso a academias e locais esportivos aos funcionários das companhias assinantes do serviço.
“Empresas precisam ser protagonistas em apoiar seus colaboradores na busca por bem-estar e a tecnologia é um grande canal para isso”, acrescentou o executivo.
A importância do investimento em bem-estar para funcionários foi o objeto de um estudo da Gympass com mais de 9 mil entrevistados nos nove países em que a empresa atua, incluindo Brasil, Argentina, Espanha, Chile, Estados Unidos e Reino Unido.
Segundo a pesquisa, 83% das pessoas entrevistadas acreditam que bem-estar é um pilar tão importante quanto o salário, enquanto 85% concordam que tenderiam a permanecer em um cargo se a empresa priorizasse estes aspectos. Além disso, 20% dos respondentes no Brasil sentem que, por conta do trabalho, não têm tempo de cuidar do bem-estar.
Em outra pesquisa, feita com mais de 2 mil pessoas pela plataforma Futuros Possíveis em parceria com a Opinion Box, 74% afirmaram que flexibilidade de horários é, depois do salário, o fator mais importante para a satisfação no trabalho. Este cenário sugere a oportunidade de promoção de uma integração entre trabalho e a vida do colaborador, com soluções tecnológicas focadas na saúde mental e física.
Um olhar para o futuro
No debate sobre como a tecnologia pode apoiar o avanço de estratégias de bem-estar, o que captura a atenção do consumidor final se entrelaça com as prioridades das corporações. Entre estas tendências, está a adoção de tecnologias vestíveis e dispositivos de Internet das Coisas (IoT), que podem fornecer dados e insights personalizados para apoiar decisões de saúde.
“A próxima grande revolução que a tecnologia poderá promover é relacionada à promoção de mudanças de estilos de vida com abordagens individualizadas”, disse Repa, durante o painel no Web Summit.
Com este objetivo em mente, a Betterme criou uma plataforma que conecta smartwatches e fitness bands com sua plataforma de coaching, com planos e conteúdo relevantes para as necessidades do usuário, com base em dados em tempo real.
A outra grande tendência em bem-estar que diz respeito tanto a indivíduos quanto a empregadores é relacionada ao uso de realidade virtual e aumentada, com experiências imersivas como salas de meditação virtuais, ou desafios de atividade física em grupo. Estas abordagens podem ajudar colaboradores, independentemente de sua localização, a se manterem engajados em programas de bem-estar.
Além disso, plataformas de bem-estar com uso de inteligência artificial permitem a criação de planos para colaboradores que são aderentes às suas necessidades, e a análise de dados permite a identificação de tendências e riscos, bem como a recomendação de intervenções.
Segundo Barbosa, da Gympass, não é preciso explicar os benefícios de investir em bem-estar a colaboradores. O desafio agora está nas mãos dos tomadores de decisão nas empresas. “Todo mundo quer estar saudável, o ponto é entender por que as pessoas não agem em relação a isso”, afirma o executivo.
“O desafio que estamos tentando resolver com tecnologia, especialmente com a personalização da experiência, é ajudar as pessoas a encontrarem uma atividade que funcione para elas, e criarem melhores hábitos usando a tecnologia como um habilitador”, conclui.
* Angelica Mari, jornalista de tecnologia, pesquisadora em cyberpsicologia e CEO da Futuros Possíveis