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Fintechs podem estar na vanguarda da IA e da Inteligência de Dados, mostra Thoran Rodrigues

5 minutos de leitura

Especialista da BigDataCorp (BDC) mostra o poder da análise de dados para pessoas e instituições, principalmente as financeiras



Por Redação em 28/03/2022

Nos Estados Unidos, não se pode analisar crédito com base no endereço das pessoas. Isso porque a segregação racial das cidades americanas faz com que decisões baseadas em informações geográficas reproduzam essa discriminação. Em escala, com o uso de inteligência artificial e machine learning, esses vícios seriam reproduzidos e amplificados. Esse é um dos exemplos de Thoran Rodrigues, fundador e CEO da BigDataCorp (BDC), para explicar o porquê o machine learning deve ser monitorado e como a análise de dados pode fazer a diferença no dia a dia das pessoas e instituições, principalmente as financeiras.

Nesta entrevista exclusiva ao Próximo Nível, o especialista demonstra tendências e novas formas de análise e gestão de dados, que podem mudar o paradigma de análises do mercado financeiro e de outros mais. Thoran também trata da democratização de dados sob o viés da abertura de informações, e mostra como isso ainda é um problema, mesmo em avanços recentes como o Open Banking. Acompanhe.

Em janeiro deste ano você escreveu um artigo onde afirmou que “estamos entrando na era industrial da informação e apenas as empresas que adotarem uma mentalidade industrial no tratamento e processamento de dados vão conseguir se manter no mercado”. Há exemplos?

Thoran Rodrigues – Grande parte das fintechs, por concorrer em um mercado com grandes instituições, por exemplo, é obrigada a ser mais eficiente. E eficiência geralmente se traduz em inteligência de informação, motivo pelo qual as fintechs têm uma predisposição maior para trabalhar com dados alternativos. Um exemplo é a concessão de crédito: se as fintechs se limitarem a avaliar o score pelos birôs de crédito, estarão fazendo o que todos fazem e terão dificuldades de competir nesse mercado concorrido. Por isso, elas têm buscado outros tipos de validações, de modelos de análise, ao mesmo tempo em que automatizam cada vez mais as tomadas de decisão. 

Quando falo em trabalhar os dados em uma escala industrial, é muito isso, pois, tradicionalmente, os processos financeiros são muito manuais, onde alguém tem de olhar a ficha, aprovar, etc. Acredito que veremos, em poucos anos, a automação da cadeia do mercado financeiro como um todo.

Quais tecnologias devem habilitar esse próximo nível?

Thoran Rodrigues – A digitalização é o pilar da automatização e abrange todos os mercados, não só as fintechs. As pessoas não querem mais ir à loja para abrir uma conta. Elas simplesmente querem abrir o aplicativo e fazer um cadastro rápido para ter a sua nova conta operante em minutos. Naturalmente, esses processos não presenciais abrem margem para risco de fraudes físicas e cibernéticas e aí há um universo para tratar do problema.

Você tem exemplos?

Thoran Rodrigues – Uma das formas mais usadas na prevenção de fraude financeira é a validação do número de telefone do cliente enviando um código por SMS ou WhatsApp. Mas isso é algo relativamente fraco, pois, em tese, só certifica que a pessoa que está tentando abrir aquela conta está com aquele aparelho em mãos. Percebemos essa fragilidade e a oportunidade de complementar essa validação, associando de maneira mais forte a pessoa ao número de telefone. 

Como essas informações/insights devem ser usadas para tomadas de decisão?

Thoran Rodrigues – Elas são contextuais, e devem ser combinadas a um processo de autenticação. Isso é primordial. É importante pontuar também que o comportamento da inteligência artificial precisa sempre ser calibrado e monitorado com muito cuidado. O que a IA – e qualquer outro tipo de modelo – faz é aprender a tomar decisões baseadas nos dados que estão disponíveis e nas decisões que já foram tomadas no passado. Isso significa que esses algoritmos pegam vieses contidos nas informações históricas e amplificam essas distorções de maneira significativa. Por isso, a seleção cuidadosa dos dados utilizados como parâmetros para a decisão, bem como a autenticação segura dos usuários, é necessária.

Um exemplo que sempre utilizamos é o das decisões sobre concessão de crédito nos Estados Unidos. Lá, tomar qualquer decisão de crédito com base no endereço das pessoas é proibido por lei. Isso acontece porque, devido ao histórico de segregação racial do país, os endereços contêm uma distorção, um viés racial, que, se utilizado em um processo de tomada de decisão automático, amplifica e restringe o acesso ao crédito com base na cor da pele. Por mais que as máquinas consigam escolher informações para tomadas de decisão, elas sempre terão como base o passado. Portanto, é preciso controlar o aprendizado de máquina (machine learning) desde o início, para não correr o risco de amplificar questões ruins, como a discriminação.

Alguns especialistas defendem que a democratização dos dados é importante e diz respeito ao poder de análise de cada usuário/cidadão. Como você avalia isso?

inteligencia artificial

Thoran Rodrigues – A democratização dos dados é fundamental, mas penso justamente o contrário: não é sobre o poder de análise dos usuários, mas sobre a disponibilização dos dados. Os volumes de dados que temos hoje são praticamente impossíveis de serem analisados manualmente. Falamos, portanto, da industrialização da análise de dados, da automação desses processos. Inclusive, há uma discussão recente muito interessante sobre o método  científico. Tradicionalmente, cientistas partem de hipóteses – simplificações da realidade – para desenvolver teorias, que depois são validadas com dados e experimentos, Hoje, alguns modelos de inteligência artificial conseguem desenvolver teorias que são incompreensíveis para uma pessoa, dado o volume de dados sendo processado.

Então não deve haver democratização de dados nesses moldes?

Thoran Rodrigues – Eu não acredito nessa transferência de responsabilidade, de dizer que os indivíduos devem cuidar dos seus dados. A democratização tem que ser sobre abertura. Defendo que as informações deveriam ser 100% abertas. Essa é a verdadeira democratização, na qual todos podem ver tudo o que existe. Afinal, se já temos todo esse poder computacional e se todas as pessoas tiverem acessos à mesma informação, teremos, aí sim, uma igualdade.

E como chegar nisso?

Thoran Rodrigues – Precisamos igualar a base. Hoje, com informações privadas para o governo, ou para determinadas empresas, como os bancos, criam-se ilhas, silos de informação. Por isso o Open Banking, conceitualmente, é muito legal, pois se trata de uma abertura. O problema é que se faz uma abertura só entre bancos, mantendo a ilha. Precisa abrir geral.

Voltando às fintechs, cada uma vem com os seus próprios silos de informação, mas a maioria participa desses sistemas mais abertos. Então enxergo que elas estão mais próximas do futuro, da tendência da informação aberta. Além disso, as fintechs fortalecem naturalmente o uso da informação alternativa. Afinal, se queremos incluir pessoas que não estão no sistema econômico, não conseguiremos fazer isso usando os processos convencionais de análise. É preciso usar novas e diversas fontes de informações para ampliar essa base, e as fintechs estão nesse caminho.

Em 2020, a BDC lançou o que chamou de “primeiro marketplace de dados”. Do que se trata?

Thoran Rodrigues – A ideia teve duas coisas simultâneas: trazer o conceito e metodologia de inovação aberta para o universo de soluções baseada em dados e, ao mesmo tempo, ajudar as empresas que já trabalham com dados, mas precisam de tração. Por conta da posição da BigDataCorp no ecossistema de dados, acabamos sendo bem horizontais, e trabalhando com muitos escritórios de data science. Eles costumam ser orientados a projetos e, geralmente, têm trabalhos interessantes para algum cliente, mas não conseguem repetir o processo para outro, tendo de começar novos projetos praticamente do zero. Isso se reflete em dificuldade para tracionar, crescer com escala. Por isso pensamos em criar um espaço para que essas empresas que têm capacidade de inovação pudessem criar produtos de prateleira e, como já temos capilaridade no mercado, podemos fazer a distribuição dessas soluções.

Como é o processo?

Thoran Rodrigues – Fazemos um trabalho a quatro mãos com as empresas que têm soluções baseadas em informação, integrando e disponibilizando isso dentro de uma plataforma para os clientes consumirem. O processo pode ser de modelagem, pois temos vários modelos de crédito desenvolvidos, ou podem ser conjuntos de informações únicas. Ou seja: trabalhamos com empresas de informação de nicho, mas que podem expandir para serem mais sofisticadas.



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