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IA generativa: nada mais será como era antes

4 minutos de leitura

Em artigo para o Próximo Nível, o jornalista Fernando Paiva conta as suas principais impressões sobre IA Generativa no Web Summit Rio



10/05/2023

Ano sim e outro também, o mundo da tecnologia traz uma nova tendência que promete revolucionar nossas vidas. O problema é que, não raro, a repercussão é muito maior do que os efeitos reais da novidade. Isso acontece em parte porque muita gente (imprensa incluída) superestima a tal tendência, ou porque ela foi apresentada antes da hora, ou seja, quando ainda não está madura o suficiente para provocar tanto impacto. Em geral, é uma combinação das duas coisas. Isso é o que chamamos de hype.

Vivemos pelo menos dois hypes muito claros nos últimos anos: NFTs e metaverso. A sensação do momento é a inteligência artificial generativa, com o ChatGPT como seu principal exemplo. Só que dessa vez, ao contrário dos tokens não fungíveis e dos avatares, trata-se de uma tecnologia indubitavelmente disruptiva e que já chega trazendo consequências concretas. A programação do Web Summit Rio comprovou isso.

A IA generativa foi a estrela do evento, discutida em diversos painéis e palestras sobre os mais variados aspectos, desde as suas oportunidades em negócios até seus efeitos colaterais na sociedade. Foi raro assistir a qualquer mesa de debates no Web Summit Rio em que o tema não viesse à tona.

Para quem não está familiarizado com o assunto, vale explicar do que se trata IA generativa: são sistemas de inteligência artificial capazes de criar conteúdo totalmente novo. Já existem exemplos de IA generativa de texto, como o famoso ChatGPT, mas também de imagens (como midjourney e Dall-E), áudio e vídeo. 

ChatGPT versus jornalismo

Os impactos na rotina de trabalho devem ser grandes. A produção de conteúdos mais simples, que não requerem tanta criatividade, já está sendo transformada pela IA generativa. Isso vale para textos curtos de sites e peças publicitárias, resumos de documentos, apresentações de slides, etc. Inclusive, há um grande temor sobre postos de trabalho que vão desaparecer por causa da IA generativa. 

Sem dúvida, tarefas repetitivas ou enfadonhas e que dispensam criatividade tendem a ser substituídas por soluções automatizadas e mais eficientes, mas sempre com supervisão humana. O jornalismo, por exemplo, não vai desaparecer, porque continua sendo necessária a construção de relacionamento com fontes, a realização de entrevistas e a perspicácia de identificar o que é uma boa pauta. “O que não nos mata nos fortalece”, resumiu Paula Mageste, CEO das Edições Globo Condé Nast, no painel intitulado “O ChatGPT vai matar o jornalismo?”.

Em negócios, foi destacado o potencial da IA generativa para soluções em áreas como finanças, saúde e direito, na produção de textos a partir de análise de dados, seja um relatório financeiro personalizado com sugestões de investimentos, uma avaliação médica a partir dos resultados de exames, ou um parecer jurídico ou uma petição judicial. 

Entretanto, em todos esses exemplos, é necessário haver sempre algum grau de desconfiança quando o conteúdo não for acompanhado de uma revisão humana. Os sistemas atuais de IA generativa ainda cometem falhas, algumas delas graves, incluindo as chamadas “alucinações”, quando simplesmente “inventam” mentiras – a rigor, tudo depende da qualidade da base de dados que alimentam esses sistemas.

Jeff Shiner
Jeff Shiner – CEO da 1password (Crédito: Ramsey Cardy/Web Summit – Flickr)

Há grande preocupação em torno da segurança também. A inteligência artificial pode ser usada para o mal, servindo, por exemplo, para identificar mais rapidamente vulnerabilidades em sistemas ou até mesmo criando campanhas personalizadas de phishing, conforme alertou Jeff Shiner, CEO da 1password.

Ficará mais difícil também identificar o que é verdade e o que é mentira, com a provável produção de fake news através de IA generativa. Para a consultora em segurança cibernética Chelsea Manning, a criptografia pode ser a saída para evitar esse problema: “ferramentas de criptografia serão essenciais para a gente verificar o que é verdadeiro ou não. A IA ainda não consegue burlar a criptografia”, disse.

Diante disso, a sociedade precisará rever também os princípios do nosso letramento digital. Uma nova educação digital será necessária para que os cidadãos aprendam a lidar com este novo mundo da IA generativa, assim como tivemos (e ainda temos) de aprender a buscar no Google ou a nos comportar nas redes sociais. Trata-se do conceito de quociente digital (QD), que vai ser tão importante no futuro quanto o quociente intelectual (QI), opinou a criadora da fundação Own Your Data, Brittany Kaiser.

Leia mais no post:

Web Summit Rio: os seus dados estão seguros?

Por fim, o Web Summit Rio foi palco de muita discussão em torno da necessidade de regulação da inteligência artificial. De um modo geral, a maioria dos especialistas concordam que ela é fundamental e premente. Mas, junto com a regulação, vem o debate sobre a concentração dessa tecnologia nas mãos de poucas empresas. 

A IA generativa demanda grande investimento em pesquisa e desenvolvimento, aliado a uma alta capacidade de processamento de dados, em um nível que poucas empresas no mundo são capazes de suportar. 

Os exemplos conhecidos estão distribuídos basicamente entre dois países: EUA e China. Assim, qual será o papel dos outros mercados, como o Brasil? Seremos meramente consumidores de IA generativa ou podemos agregar valor a essa tecnologia? Como podemos usufruir ao máximo dela e eventualmente contribuir para o seu desenvolvimento sem nos tornarmos ainda mais dependentes dos EUA e da China? Essas são perguntas para serem aprofundadas no próximo Web Summit Rio, marcado para o ano que vem, desde que não apareça algum novo hype que roube a nossa atenção até lá.

* Fernando Paiva é editor do Mobile Time e atua há 22 anos como jornalista de telecomunicações



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